
Dirigido por Danny Boyle
Sou mochileiro de coração, mente e alma. Tenho desejos e anseios de conhecer os lugares, as pessoas e as culturas que existem mundo à fora, na infindável variedade de realidades que nem ao menos imaginamos existir. Apenas por este fato, posso dizer que meu ponto de visto sobre A Praia não é muito imparcial, mas sim, criado com base em sonhos e devaneios de um eterno aventureiro.
A Praia é uma ambição de vida, é o desapego das amarras da sociedade e uma abraço a todos os significados que a palavra liberdade pode ter. É o desprendimento dos padrões que vemos, usamos e comemos todos os dias e a criação de uma outra filosofia de vida em função da renúncia de nossos paradigmas. E posso dizer, por experiência própria, que isto não tem nada de novo, e permeia a existência de inúmeras pessoas ao redor do globo. E por este motivo é que, a cada dia que passa, fico ainda mais apaixonado por esta concepção de vida.
Richard (Leonardo di Caprio) é um mochileiro de vinte e pouco anos de idade, desligado de suas raízes, que vive viajando pelo mundo à fora. Porém, cansado dos mesmos padrões vistos em todos os lugares, ele se questiona se existe algo realmente novo lá fora, para ser descoberto. Em Bangkok, Tailândia, ele conhece Daffy (Robert Carlyle), um viajante aparentemente lunático, que vive em devaneios sobre uma ilha que guarda uma praia secreta e de raríssima beleza perfeita. Sem acreditar nas palavras do novo conhecido, no dia seguinte o acha morto no quarto ao lado, resultado de suposto suicídio. Ainda transtornado pelo acontecimento, ele acha um mapa para a tal praia secreta, desenhado pelo suicida em questão. Junto com dois novos amigos, os franceses Étienne (Guillaume Canet) e Françoise (Virginie Ledoyen), ele parte em busca do tal paraíso perdido, em uma jornada de descobertas e conflitos, sem saber que o caminho lhes reserva enormes surpresas, nem sempre agradáveis.
Danny Boyle é mais um daqueles que podemos chamar de "o cara"! Tenho enorme respeito pelo trabalho deste britânico de pouco mais de 50 anos, desde sua primeira experiência em cinema, depois de quase 10 anos fazendo obras para televisão. Começando pelo ótimo Cova Rosa, passando pelo clássico cult Trainspotting, ele mantém uma carreira de respeito, com obras de presença com o leve humor negro de Por Uma Vida Menos Ordinária, a viagem conotativa de A Praia, o terror estarrecedor de Extermínio e a jornada interplanetária de Sunshine - Alerta Solar.
Parte das razões dos sucessos de Boyle se deve as parcerias de longo prazo que ele estabeleceu com roteiristas novos, porém de enorme qualidade. Até este A Praia, o diretor havia feito todos os seus trabalhos com o amigo John Hodge (Cova Rasa, Trainspotting, Por Uma Vida Menos Ordinária, A Praia). Em A Praia, que, na verdade é adaptada do primeiro romance do, também britânico, Alex Garland, Boyle encontra seu segundo parceiro de roteiro, o próprio autor do livro. Junto com Garland, Boyle ainda realizou Extermínio e Sunshine - Alerta Solar.
Independente das associações e parcerias, a verdade é que a qualidade das obras de Danny Boyle são indiscutíveis do ponto de vista da originalidade e da transgressão de padrões e valores. As cenas de loucura e psicodelia são constantes em suas produções, assim como os devaneios de seus personagens. Sempre permeados por narrações em off, seus filmes são um deleite para os fãs de um cinema um pouco mais alternativo do que o que vemos no circuito comercial. É verdade que, com a fama, a tendência é que o dinheiro fale mais alto (o que aconteceu com Guy Ritchie, por exemplo) mas, até o momento, Boyle continua a se mostrar o mesmo.
O elenco de A Praia também é elogiável. Leonardo di Caprio é, sim, senhores, um bom ator, apedar do que digam os críticos e outros não-admiradores do trabalho do ator (que, provavelmente, pegaram birra do californiano quando ele fez o Jack Dawson, de Titanic, e todas as menininhas, incluindo as namoradinhas, foram aos cinemas para suspirar pelo astro). Ele não é um camaleão como Brad Pitt, que em minha opinião é um dos mais talentosos e versáteis atores da atualidade, mas sempre fez bons trabalhos, seja no início de carreira em Gilbert Grape - Aprendiz de Sonhador, Diário de Adolescente ou no gracioso Romeu + Julieta, de Baz Luhrmann, quanto na maturidade cinematográfica de O Aviador, Os Infiltrados e Diamante de Sangue. O estereótipo de mocinho bonitinho foi sinônimo de di Caprio somente em Titanic e não faz jus a seu talento e trabalho.
É verdade que Leonardo di Caprio não era a primeira opção do diretor Danny Boyle. Aliás, na verdade, ele foi escalado diretamente pela 20th Century Foz para o papel de protagonista, à revelia do diretor, que quer Ewan McGregor estrelando mais essa obra. Realmente, McGregor elevaria o filme, talvez até a um status de cult movie, assim como o fez com diretor Boyle em duas outras oportunidades, Cova Rasa e Trainspotting.
O grupo de jovens atores coadjuvantes surpreendem pela eficiência, com destaque para os franceses Guillaume Canet e a bela e exótica Virginie Ledoyen. Muito requisitados no cinema e televisão franceses, eles trazem uma diferenciação do padrão americano de interpretação, com seus sotaques e posturas característicos. Ainda como coadjuvantes, Robert Carlyle, o lunático Daffy Duck (ou Patolino, em português) está sensacional em mais um personagem mutante em sua carreira, enquanto Tilda Swinton constrói seu caminho para seus personagens andróginos e sensuais de Constantine e As Crônicas de Nárnia.
A trilha sonora é maravilhosa, com direito a um playlist eclético, com Faithless, New Order, Underworld e Orbital (recorrentes nas obras do diretor), Sugar Ray, The Chemical Brothers, Blur e até All Saints, na ótima e rítmica Pure Shores. Porém, a obra-prima presente no filme é Porcelain, de Moby, uma das músicas mais profundas e inspiradas que já escutei. Totalmente conectada ao tema do filme, apenas escutar a introdução dela já é motivo para despertar aquela vontade de chorar, visando a "busca pelo prazer", como diria o personagem de di Caprio.
Praticamente todo filmado na Tailândia (Ko Phi Phi Leh, Phuket, Bangkok), a ilha com a tal praia existe na vida real, porém extremamente lotada de turistas, principalmente depois do lançamento do longa-metragem. Ele não é realmente como no filme, totalmente cercada por montanhas e penhascos; existe uma fenda imensa entre as montanhas que ficam exatamente na frente da praia, o que foi modificado digitalmente para dar um efeito de exclusividade ainda maior no filme.
Ko Phi Phi Leh foi devastada totalmente no tsunami de 2004, deixando um rastro de estimadas 4 mil mortes. Aos poucos, a ilha vem se recompondo com ajuda internacional para se reestruturar para o turismo.
Cair no mundo, viver na estrada, não ter destino certo, tem seus fascínios e suas ilusões; nem sempre as coisas saem como planejadas, mas o futuro não pertence a Deus, mas sim, a quem deseja inventá-lo e construí-lo. Os altos e baixos fazem parte do pacote, a questão é fazer de tudo (do possível e, às vezes, do impossível) para que o saldo seja sempre positivo. E no final das contas, se deliciar com sua própria jornada.
Nota: 7,9/10
Direção: Danny Boyle
Roteiro: John Hodge & Alex Garland
Elenco: Leonardo di Caprio & Virginie Ledoyen & Guillaume Canet & Robert Carlyle & Paterson Joseph & Tilda Swinton
Estréia: Fevereiro de 2000
Gênero: Aventura & Drama
Duração: 119 minutos
Distribuidora: 20th Century Fox
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por Felipe Edlinger
05 de novembro de 2008
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por Felipe Edlinger
05 de novembro de 2008
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