
Directed by Quentin Tarantino
Um filme de Quentin Tarantino é pretexto para um bom programa? Eu diria que sim, contanto que você mantenha a mente aberta para o novo ou para o refresh do velho e antigo, como algo cool.
É exatamente isso que acontece nessa produção "irmã" de Planeta Terror, dirigido por Robert Rodriguez. Os dois amigos, Tarantino e Rodrigues, dois dos mais celebrados e bacanas diretores de Hollywood, resolveram fazer uma homenagem aos antigos filmes de drive-in, de produção barata e acabamento duvidoso, com essa sessão dupla. Nós, de fora dos Estados Unidos da América, não somos muito familiarizados com o tema, mas este seria a boa e velha sessão dupla, a qual eles chamaram de Grindhouse.
Depois de Kill Bill e as referências ao cinema exagerado asiático, com sangue e coreografias absurdas, Tarantino resolve homenagear os road movies dos anos 70, com perseguições, carros possantes e tramas com cidades minúsculas do interior americano.
A ambientação do filme é totalmente anos 70, como roupas, carros, bares, cidades e músicas, porém, com contraste aparentemente proposital (mais uma boa sacada) com celulares, iPods e carros modernosos.
A história gira em torno de Stuntman Mike (Kurt Russell), um duplê que tem um carro à prova de morte, que sai pelas estradas do país, buscando vítimas para serem mortas. Puro e simples.
Aliás, para deleite dos fãs, Kurt Russell, rei dos filmes absurdos de aventura, traz toda a sua aura dos filmes trash para essa produção. Com um pouco de seu Ryan Snake, de Fuga de Los Angeles e Fuga de Nova York, ele dirige dois carros clássicos, desejos de qualquer garotão de décadas passadas, um Chevy Nova 1970 e um Dodge Charger 1969.
Assim como Tarantino fez, propositadamente, Kill Bill parecer exagerado demais (uma referência ao cinema asiático, como já dito aqui), neste filme ele faz a produção parecer tosca, da mesma maneira, com intenção de ser.
A caracterização como uma produção típica de cinema barato dos anos 70 apresenta ruídos no filme, cortes abruptos de cena e falhas no áudio. Mas, ao invés de nos fazer pensar que o produto é ruim, nos faz achar graça.
Apesar do nome errado em português (o correto seria "À Prova de Morte"), essa é mais uma bola dentro de Tarantino, apenas para variar um pouco. Ele inova com filmagens em primeira pessoa dentro do carro e outros planos de câmera diferentes como ele gosta de fazer, sendo, inclusive diretor de Fotogradia do filme.
Tudo faz parte da já mitológica direção de Tarantino, das cenas em preto e branco e a mudança para o colorido com uma ação-gatilho na tela, como utilizado em Kill Bill, à quebra de ritmo com música romântica caricata das produções da época. Isso sem contar a sua tradicional aparição em seus filmes, desta vez como Warren, o cara que serve Chartreuse para as garotas em um bar, na primeira metade do filme.
E Tarantino não se leva muito à sério, ou, ao menos, quer dar a impressão de que não se leva muito à sério. Um exemplo disso são os comentários e piadas presentes no próprio filme como "mean girl on a high school movie". Porém, quando o assunto é fazer efeitos de primeira categoria, sem parecer bobos ou irônicos, ele também não deixa a desejar, como podemos ver nas impressionantes cenas de colisões automobilísticas, incluindo a extremamente (e horrivelmente) detalhada cena da mutilação das primeiras vítimas de Stuntman Mike, na primeira metade do filme.
Essa mescla de ar sério com piada faz parte de toda a filmografia do diretor e, neste filme, também não poderia deixar de ser. Existe um contraste bastante considerável entre as duas metades da produção: a primeira poderia até ser considerada parte de um filme de terror e suspense, enquanto a segunda tem um jeitão mais de comédia. Depois de um começo de deixar o mais centrado dos fãs em frangalhos, o filme (de novo, propositadamente) descamba para o deboche. E o faz bem! O mesmo pode ser dito se compararmos os dois Kill Bill, que inicialmente foram criados como partes de um único filme.
Como sempre, a trilha sonora, mais uma tradição das produções de Tarantino, não poderia ser ruim. Muito pelo contrário, é digna de um CD permanente no console do carro, com destaque para Baby It's You (Smith), Jeepster (T. Rex), Staggolee (Pacific Gas), The Love You Save (Joe Tex), Good Love, Bad Love (Eddie Floyd), Down in Mexico (The Coasters), entre muitas outras.
E preparem-se para mais uma sessão endiabrada de diálogos espertos, com muitas referências pop, e apimentados, com comentários crus sobre sexualidade. Meu favorito (e já parte de minhas frases famosas de filmes) é o proferido por Kurt Russell, quando questionado em um bar, por uma das meninas do filme, sobre o porquê de ele não estar bebendo bebida alcoólica; a pérola vem pl(ácida): "O álcool é apenas um lubrificante, para todos os encontros entre indivíduos, que um bar oferece."
Para os fãs de carteirinha, o filme é um grande easter egg e apresenta inúmeras referências à outras produções do diretor, o que aumenta ainda mais a graça do filme. Na jukebox aparece a opção da música Miserlou, de Dick Dale (Pulp Fiction), uma das garotas diz que há um outdoor perto do Big Kahuna Burger (Pulp Fiction), o toque de celular é The Killer Song (Kill Bill v1), o xerife e o filho dele, que vão ao hospital depois do acidente de carro são os mesmo de Kill Bill. Ainda nas referências musicais, temos Natural High (Jackie Brown), Little Green Bag (Cães de Aluguel) e Don't Let Me Be Misunderstood (novamente, Kill Bill v1).
Apesar da estratégia de Quentin Tarantino e Robert Rodrigues ter foco nos Estados Unidos, o sucesso, infelizmente, não foi o mesmo no Brasil, mesmo porque os filmes foram apresentados separadamente para maiores bilheterias. De qualquer maneira, é uma excelente pedida para os fãs ou para os marinheiros de primeira viagem. De mente aberta, é lógicos.
Nota: 8/10
Felipe Edlinger
24 de dezembro de 2007
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Observação: somente um membro deste blog pode postar um comentário.